Praia da Vitória

 

Começou por ser baptizada por Praia mas em 1829, depois de ter tomado o partido dos Liberais contra os Absolutistas e ter resistido à armada Miguelista, ganhou o topónimo de “Vitória”. E assim nasceu a Praia da Vitória.

Já no nosso século, a cidade foi marcada, durante várias décadas, pela proximidade da base aérea das Lajes e, por isso, habituada ao convívio com os ingleses e norte-americanos que aqui habitavam, e que impulsionou exponencialmente o seu desenvolvimento, e ainda que agora sejam apenas algumas centenas não nos podemos esquecer que já foram dezenas de milhares.

A marina e a praia, o extenso areal de areia clara (da maior baía dos Açores) e uma zona costeira com lojas e restaurantes são o centro de grande animação, sobretudo no verão.

A melhor forma de ter uma visão abrangente sobre a Praia da Vitória é subir ao Miradouro do Facho, onde está um monumento em homenagem ao Imaculado Coração de Maria: a estátua tem 6 metros de altura e está instalada sobre um pedestal de 16 metros de altura, já o nome Facho remonta a tempos passados, este ponto era o local onde mantinham uma fogueira, acesa todas as noites, com a função de farol, para avisar a navegação. 

Depois, durante a Guerra Civil Portuguesa (1828-1834), na Serra do Facho foi recuperado pelos Liberais o antigo sistema de fachos (sinais de bandeiras em mastros em cruz), que foi evoluído ao ponto de ser capaz de enviar mais de 60 mensagens diferentes em meados do século XIX.

Mas muitas são as histórias que contam estas gentes. A cidade é rica em história, monumentos, lendas e tradições e o centro histórico é sem dúvida o seu principal ex-libris, onde ruas calcetadas com muita arte e uma arquitectura típica, se destacam.

Um dos aspectos mais curiosos é o Passeio dos Poetas onde, literalmente, de rua em rua, andamos a descobrir poesia, poetas locais e a homenagear os grandes vultos da literatura portuguesa que aqui nasceram, como Natália Correia e Vitorino Nemésio.

São um total de 33 painéis de azulejos com excertos de poemas, que vamos descobrindo de esquina em esquina e também junto ao mar. Estes azulejos, feitos pelo artista local, Ramiro Botelho, apresentam o desenho e o nome do respetivo poeta sendo que maioria são locais com obra publicada na colectânea Improvisadores da Ilha Terceira.

E por falar em poetas é obrigatória a visita Casa das Tias de Vitorino Nemésio, um casarão datado do século XVIII e reconstruída após o sismo de 1841 e onde o escritor passou grande parte da sua infância e juventude. Sobre esta casa ele escreveu certa vez “A casa das tias (conta Mateus Queimado) era o recesso da minha vida. (…) Era um casarão confortável, quase um palácio. Com as suas dez janelas rasgadas sobre a sacada de rexas, a que lá chamam ralos, fitava a Igreja do Senhor Jesus das Misericórdias, que parecia tratar de potência a potência.”


A igreja mesmo em frente de que Vitorino Nemésio falava, está ali, mesmo em frente, um curioso exemplar de edificação religioso. A igreja do Senhor Santo Cristo também denominada Igreja da Misericórdia. O edifício original foi edificado em 1521, sob a invocação do Senhor Santo Cristo que abrigava uma raríssima imagem do Divino Pai Eterno, única nos Açores, e a que é dedicada uma grande devoção por toda a ilha. A imagem, segundo reza a tradição, apareceu, um dia, junto à costa dentro de uma grande caixa que boiava no mar, não se sabendo a sua origem.


Em 1921 foi quase que completamente destruída por um violento incêndio, tendo sido reedificada em 1924. Se é exuberante por fora o interior é bastante curioso, com dois altares principais lado a lado, resultado da união de duas capelas destruídas durante o incendio.

Uma cidade encantadora e acolhedora que deve ser visitada com tempo para apreciar não só as pequenas singularidades do quotidiano como os testemunhos de histórias passadas que já se vão misturando com a imaginação popular.

Base Aérea N.º 4 - Base das Lajes

 


Já refeitos do nosso safari vulcânico, decidimos que hoje o dia era dedicado à Vila da Praia da Vitória.

A caminho da cidade, e graças aos nossos mais recentes amigos, foi-nos permitida uma rápida visita à Base Aérea das Lajes com direito a enquadramento histórico. Situada na Freguesia das Lajes, da Vila da Praia da Vitória, a base tem também anexo o molhe norte do porto da vila ao qual está ligada por uma estrada militar.

Com uma área de cerca de 10km2, foi construída em 1941 no decorrer da Segunda Guerra Mundial, dado o seu posicionamento estratégico em pleno Oceano Atlântico. Com a saída dos britânicos, em 1946, um destacamento das Forças dos Estados Unidos transferiu-se, definitivamente, para a Base das Lajes oficialmente designada como Base Aérea N.º 4.



Quando entrámos o portão foi como chegar a um enclave dos Estados Unidos. Um condomínio fechado com muros e gradeamentos, uma grande escola (que alberga desde a pré-primária ao ensino universitário) quatrocentas moradias amplas com jardim e vista para o mar, tipicamente americanas. O nosso cicerone descreveu-as como sendo todas iguais: uma grande cozinha, lavandaria no primeiro andar, ventoinhas no teto em todas as divisões, tomadas elétricas de 110 volts em vez dos 220 volts portugueses (para que os americanos não alterem o seu quotidiano). Ainda de acordo com ele, a tipologia das moradias (do T2 ao T4) era atribuída de acordo com a patente militar.

Para dar realismo a sensação de estarmos em território americano, cruzámos como uma robusta jovem estudante a caminho da escola a beber Coca-Cola por uma palhinha de um copo que trazia debaixo do braço. Eram 08.30 da manhã. Entretanto passa por nós um autocarro de transporte do contingente americano à cidade, um Blue Bird.


Realidades americanas!

Alguns anos depois a base abriu visitas ao publico, mas naquela altura, foi um início de dia diferente para nós.

Hoje com uma realidade diferente e personagens diferentes valerá com certeza a pena visitar um local que é um testemunho histórico da história recente, e onde são proporcionadas visitas à Torre de Controlo, ao Quartel dos Bombeiros e ao Núcleo Museológico da Unidade.

Algar do Carvão


Um dos locais mais impressionantes que visitámos. A 583 metros de altitude, está classificado como Monumento Natural Regional, devido às suas características únicas.

Advertimos que não há fotografias que consigam descrever este local. Tentámos, mas ficámos sempre muito aquém da realidade. Só mesmo indo lá, para ver e sentir.

O cone vulcânico que alberga no seu interior o Algar do Carvão, situa-se sensivelmente a meio da ilha Terceira, a norte da cidade de Angra do Heroísmo, muito perto das Furnas de Enxofre.

É a Associação Os Montanheiros que assegura as visitas do público, as quais decorrem durante todo o ano (na época baixa semanalmente na época alta com frequência diária). Por questões de segurança todas as visitas são feitas com guia, pelo que aconselhamos programar a vossa com antecedência pois os horários são reduzidos.

O segundo conselho, para além de calçado adequado, é levarem um impermeável a contar com temperaturas baixas e pingas de água constantes.

Se chegarem mais cedo, podem esperar numa sala rustica, adequada ao local e onde, para além de venderem os bilhetes de entrada, se encontram expostos vários artigos sobre a história da associação assim como alguma informação de espeleologia.

Há hora marcada começamos a tão desejada descida com o nosso guia.

De forma simplista podemos descrever o Algar como uma grande chaminé vertical, alargada junto à base, que resultou de um fenómeno vulcânico muito específico.

As brochuras informam que “… o Algar do Carvão terá tido origem na grande erupção do Pico Alto que lançou lava a grande distância. Posteriormente, uma outra erupção basáltica iniciou o processo da formação de um outro vulcão, o Pico do Carvão. Numa primeira fase, formou-se a zona da lagoa e as duas abóbadas sobre ela, e só numa fase final, aquando das descidas mais profundas do magma, se formou o Algar”.

Numa visita que durou sensivelmente trinta minutos descemos cerca de 100 metros de profundidade, graças a uma escadaria construída para o efeito, e observámos estalactites únicas no mundo pelas suas características de silicatos e um lago subterrâneo de águas transparentes alimentado por águas das chuvas.


A beleza deste Algar mostra-se também na vegetação que recobre o interior do cone, com incontáveis tons de verde.


Uma experiência inesquecível, com a natureza a surpreender com a imponência dos seus segredos e com a beleza das suas construções.


Furnas do Enxofre

 

Com uma paisagem vulcânica e deslumbrantes repleta de sítios de interesse geológico, esta é a ilha que tem a maior área florestal nativa do arquipélago o que se traduz numa rica geodiversidade.

Aproveitámos as boas condições meteorológicas do segundo dia da nossa estada para conhecer Furnas do Enxofre, classificadas como Monumento Natural Regional.

Localizadas na zona central da ilha Terceira, no Arquipélago dos Açores, e ao contrário das muito conhecidas furnas de S. Miguel, não são utilizadas para cozinhar.

Estas furnas, constituídas por um campo de fumarolas, uma área com diversas saídas de gases vulcânicos agressivos, a diversas temperaturas, algumas bastante elevadas (cerca de 95º C à superfície e de 130º C a meio metro de profundidade), podem ser observadas a partir de um passadiço, numa área total de 64.746 metros quadrados.

Como nos explicaram no local, o circuito de visitação foi concebido para permitir, por um lado, um acesso seguro aos visitantes e, por outro, a protecção dos habitats através da utilização de material rústico, integrado na paisagem.

Não foram esquecidos ao longo do percurso painéis informativos para os visitantes perceberem o que estão a observar.

Ao percorrermos o passadiço, único percurso permitido, construído no meio das fumarolas, sentimos a intensidade do cheiro das saídas de gases vulcânicos e a brisa quente a não nos deixa esquecer a temperatura do solo.

As Furnas do Enxofre estão situadas muito perto do Algar do Carvão. Local da nossa próxima paragem!

Ilha Terceira, dos Vulcões e dos Impérios

 


Como da Macaronésia já conhecemos a Madeira a aposta deste ano foram os Açores!

O termo Macaronésia de origem grega significa “ilhas afortunadas”, uma denominação que se costuma utilizar para falar dos arquipélagos do Atlântico Norte, que desfrutam de um clima invejável e de uma biodiversidade que chegou a estas ilhas por ar e por mar.

Começamos a nossa ronda pela Ilha Terceira, aquela que já foi de foi chamada de Ilha de Nosso Senhor Jesus Cristo das Terceiras (pelo facto de ter sido a terceira ilha encontrada pelos navegadores portugueses) e a segunda ilha mais povoada dos Açores mas, ainda assim, com menos de metade dos habitantes de S. Miguel.

Depois de um excelente voo fomos até ao hotel apenas por as malas e mudar de roupa. Chegámos num dia farrusco, com uma ameaça de chuva latente, mas isso não nos desencorajou e a nossa curiosidade levou-nos  a começar logo a descobrir as pitorescas ruas Angra do Heroísmo, classificada como Património Mundial pela Unesco.

Encontramos uma cidade agradável, harmoniosa, com promessas de segredos para descobrir, desde as belas fachadas do centro histórico, às igrejas e impérios, sem nunca perder o mar de vista.

A primeira recordação que temos é a Igreja da Misericórdia, consagrada ao Santo Padroeiro da cidade desde 1707: Santo Cristo da Misericórdia. A igreja de estilo barroco de fachada de azul que fica gravada na memória.

Mas o que primeiro nos chamou a atenção foram as pequenas casas, a maior parte pintadas de cores fortes, que se espalhavam um pouco por toda a cidade. 

Perante a nossa curiosidade explicaram-nos que se chamavam Impérios. Pequenos templos, únicos em Portugal, onde entre o domingo de Páscoa e os domingos de Pentecostes, se venera o Espírito Santo nos Açores. À volta destes Impérios acontecem durante vários dias as festividades do Espírito Santo: Um conjunto de cerimónias religiosas e profanas que vai desde a “coroação” do Imperador Menino ao desfile de cortejos e o bodo de pão e de carne.

Os primitivos edifícios eram desmontando-se após a festividade. Só no século XVIII surgiram os primeiros Impérios construídos em alvenaria e, dizem, a sua originalidade foi inspirada nas características das anteriores construções desmontáveis, mas também em influências orientais e da confluência de culturas, decorrentes da posição estratégica da ilha Terceira.

Existem setenta e um Impérios (muitos mais dos que vimos), todos eles com cerca de 30m2, constituídos por uma única divisão tendo a parede de fundo um altar ou um nicho para exposição dos símbolos do Espírito Santo: a coroa, assente numa salva, de prata, e o ceptro.

São monumentos a visitar, que ultrapassam o significado religioso e assumem maior importância enquanto testemunho histórico e originalidade, pois são únicos no mundo.

Perpignan

 

Depois de 140 quilómetros de Barcelona até ao Teatro-Museu Dalí, em Figueres, seria uma pena não apanhar o TGV para qualquer coisa como vinte minutos de viagem até Perpignan.


Uma decisão de impulso que acabou por não ser no melhor dos dias, pois havia greve geral e muitos serviços estavam encerrados, incluindo os postos de turismo.


Um pequeno contratempo que não deixámos que estragasse o dia, em primeiro lugar porque conhecíamos um pouco da história da cidade e em segundo porque a sorte nunca nos deixou ficar mal.


Ao longo dos séculos esta pequena cidade seduziu grandes artista como Picasso, Salvador Dalí, Matisse, Pau Casals ou Maillol. Sita na Catalunha do Norte, nos Pirenéus orientais, região de Occitania, é a capital histórica do Rosellón e pertence a França desde 1659.

Mas a sua história é conturbada. Primeiro esteve nas mãos do Conde de Empurias, depois passou para o condado de Barcelona. Durante mais de duas décadas, foi capital do Reino de Mallorca sendo, mais tarde, anexada a coroa de Aragão-Catalunha.

Durante a Guerra Civil Espanhola, no começo de 1937, Perpignan viu as ruas e praias serem evadidas por refugiados espanhóis que chegavam a França por mar ou através dos Pirenéus, que atravessavam a pé durante longos dias. Já durante o regime franquista (1939-1975), os espanhóis voltaram a visitar Perpignan desta feita para ver os filmes proibidos na Espanha, como o último Tango de Paris.


Hoje é uma cidade pequena e pacata, com um centro histórico onde se multiplicam bares simpáticos e lojas agradáveis e elegantes. A típica cidade para se conhecer a pé, andar pelas ruas e perder-nos nelas.

As nossas deambulações levaram-nos até à Rue des Archers, no centro histórico onde ser ergue o Palácio dos Reis de Mallorca. Datado do século XIII e erguido pelo rei de Maiorca, Jamie II, que desejava ter uma residência na capital continental do seu reino, o palácio foi a base do reino efêmero da cidade na época em que Perpignan era considerada o coração económico, político e cultural da região mediterrânea medieval.

A construção começou num estilo romano tardio, mas ao longo dos anos que demorou a sua construção transitou para o estilo gótico. Destacam-se a imponente Torre da Homenagem, que servia de entrada, a capela interior, ornada com um portal de arcos de mármore azul e rosa, os aposentos reais (alguns ainda mantém as decorações originais) e a vista que se estende até o monte Canigou. A opulência deste palácio impressionante não nos deixa indiferentes.


Saindo do palácio, atravessando o centro histórico, chegamos à Rue de l'Horloge, onde se ergue a Basilique-Cathédrale de Saint-Jean-Baptiste que se distingue pela sua dimensão. São oitenta metros de comprimento por vinte seis metros de altura. Mas particularidade mais valorizada pelos locais são as duas relíquias de São João Baptista aqui guardadas.

Mas se tivermos que indicar o local que se distingue pela originalidade é, sem dúvida, o claustro-cemitério de Saint-Jean, conhecido como Campo Santo, geminado com a Basílica, e que é o maior e mais antigo cemitério medieval da França. Assim que chegamos a primeira percepção é de grandeza. Cada lado tem de cerca de 56 metros, cercado por túmulos em forma de arco, que originalmente formavam quatro galerias, três das quais ainda permanecem intactos.  Uma sucessão de pórticos góticos, em mármore branco, ostentam os escudos e armas das então famílias nobres de Perpignan.

A construção deste curioso sítio iniciou-se no início do século XIV e o ossário central foi escavado em 1321. A nordeste, a capela funerária, dedicada a São João Evangelista, construída no final do século XIV, adornada com vistosos vitrais, destinava-se a cerimônias fúnebres.


Os séculos passaram e o Campo Santo deixou de ser cemitério há muito tempo. Agora, para além de um valioso testemunho histórico, é cenário para concertos de verão ao ar livre.


Um pouco mais a baixo os nossos passos levaram-nos até à Rue de la Main de Fer e à Casa Xanxo, um dos edificios  mais conhecidos de Perpignan. De estilo gótico, o que a torna motivo de interesse é a decoração da fachada, especialmente o insólito friso, com inúmeros personagens mitológicos de ar estranho e ameaçador. 

Os locais afirmam que se trata de uma representação do inferno e dos sete pecados capitais.  A entrada é gratuita e no interior poderá ver uma exposição sobre a cidade de Perpignan, a decoração interior essa é muito mais sóbria.


O dia estava a chegar ao fim, mas pelo caminho ainda ficaram umas horas de esplanada onde saboreamos umas excelentes moules à la marinière que em nada ficaram atrás das cozinhadas pelos vizinhos belgas. Fica a sugestão!

Tarragona: dos Gladiadores ao Caga Tió

 


Fomos para sul de Barcelona. Cem quilómetros após o início da viagem eis-nos em Tarragona, uma cidade com origem na cidade romana de Tarraco, fundada no ano 218 a.c. e que na sua época foi um exemplo para todas as capitais do império romano. A importância do legado é tão importante que, em 2000, a UNESCO declarou o conjunto arqueológico de Tarraco como Património Mundial da Humanidade.

Assim que entramos na cidade identificamos vestígios da presença romana espalhados por toda a parte, mas o destaque é sem dúvida o majestoso anfiteatro, de forma oval, construído a um passo do mar, com capacidade para catorze mil pessoas e onde aconteceram inumeras e sangrentas lutas de gladiadores e execuções publicas.

Construído no século II d.c., chegaram até aos nossos dias a arena e uma parte da escadaria de pedra. Apesar de muitas das esculturas e vestígios estarem no Museu Arqueológico Nacional de Tarragona, localizado no bairro de Serrallo, a visita ao interior do anfiteatro é imperdível. É só quando pisamos a arena que sentimos a sua verdadeira dimensão e imaginamos o que terá sido este local no seu apogeu.

Outra curiosidade é, após o declínio do império romano terem edificado, no  interior deste anfiteatro, uma basílica visigótica sobre a qual se ergueu, posteriormente, a igreja medieval Santa Maria do Milagre. Ao redor do templo foi também construído um cemitério com túmulos escavados na arena e mausoléus funerários, de que ainda podemos encontrar testemunhos.

Após gastarmos um bom par de horas a admirar a originalidade do anfiteatro continuámos o nosso caminho e subimos a Calle Mayor, repleta de lojas de lembranças e produtos locais, até à praça Pla de la Seu, onde encontramos a majestosa a Catedral de Santa Tecla. Neste local existiu um templo dedicado a Augusto e foi sobre ele que em 1171 se iniciou a construção da Catedral. Dizemos iniciou porque ela é hoje o resultado de múltiplas contribuições arquitetónicas ao longo de vários séculos e de diferentes estilos artísticos.


As fachadas caracterizam-se pela falta de uniformidade provocada pelos diferentes volumes das capelas anexadas, no século XV, aos corredores laterais, que incluem notáveis ​​intervenções medievais, renascentistas e barrocas.

Desde a fachada até ao topo da torre sineira ela está repleta de memórias históricas importantes e belas obras de arte: desde o Altar-Mor, ao retábulo de madeira dedicado à padroeira da cidade, Santa Tecla, as várias esculturas medievais peculiares, à coleção mágica de esculturas de madeira, aos murais medievais magnificamente preservados, toda a sacristia, a decoração interior da cúpula, o Museu Diocesano e finalmente o magnífico claustro, datado do século XII, um local destinado à leitura, caminhada e meditação mas também à realização de procissões.

Em 2007 mais um testemunho histórico se junto a este tesouro histórico  quanto os restos mortais de Augusto, a quem o templo romano original era dedicado, foram localizados na nave central após campanhas de escavações arqueológicas e levantamentos geofísicos. 

Longos foram os minutos passados na Catedral, de pescoço levantado a admirar e a interpretar não só a beleza como a mensagem que chegou ate nós, desde os tempos medievais. Ao sairmos novamente para a Pla de la Seu, merecemos sentar-nos numa das esplanadas a retemperar forças e a apreciar esta praça rodeada de edifícios históricos como o Palau de la Cambrería. Uma envolvente que dá outro sabor a qualquer pausa.

Mas se a opção for almoçar, então sem dúvida a aposta é a Plaza de la Font, localizada entre a Rambla Nova e a cidade velha e a mais popular de Tarragona. Uma praça alongada cheia de bons restaurantes e esplanadas convidativas para comer e fazer planos de viagem.

Repostas as calorias, fomos descer a Rambla Nova, a rua mais famosa da cidade e onde descobri um dos monumentos mais fotogénicos da cidade: A homenagem aos Castellers.

Em Tarragona, os castells constituem uma tradição profundamente enraizada, declarada Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO.  Em Outubro, dos anos pares, realiza-se o "Concurso Castells", onde os colles (grupos) se encontram na Tarraco Arena Plaça para competirem. A primeira competição realizou-se em 1932 e contou com a participação de apenas quatro colles castelleres:Colla Vella dels Xiquets de Valls, a Colla Nova dels Xiquets de Valls, a Colla Vella dels Xiquets e a Colla Nova dels Xiquets de Tarragona.

A segunda edição aconteceu em 1933, mas não houve continuidade e a edição seguinte só aconteceu em 1952 e depois em 1980. Desde então, o Concurs de Castells é realizado a cada dois anos.

Mas o que são castells: Inicialmente os membros mais velhos de um Castell juntam-se no solo formando um círculo apertado para servir de base para que a estrutura possa ganhar altura, a chamada Pinya. Quando o castelo humano alcança uma altura estipulada, várias crianças de sete e oito anos sobem pelas costas dos demais até chegarem à parte mais alta e levantam a mão, uma Aleta, sinal de que o Castell foi concluído com sucesso.


Depois as crianças começam a descer e quando todos os membros estiverem no chão, o público aplaude em sinal de que o Castell foi completado e não caiu.

Como alguém me explicou quando eu admirava a estátua, as crianças que hoje tocam o céu amanhã serão a base e a solidez de um castell.

E despois da interessante descoberta dos Castell, aconteceu mais uma, nos mercados de Natal de Tarragona. Todas vendiam dezenas de Tió, um curioso e pequeno personagem construído com um pequeno tronco de madeira, um típico chapéu catalão (a barretina), pequenas pernas de madeira e uma cara sorridente.

Foi aqui que alguém nos explicou que o Caga Tió tem um importante papel no Natal catalão. A partir do dia 8 de Dezembro, o Caga Tió que decora as casas no Natal, é coberto com um pequeno cobertor, para que não sinta frio e todas as noites é "alimantado" com frutos secos.

Na noite de24 de Dezembro, o Caga Tió é colocado junto à lareira ou à arvore de Natal. Manda a tradição que as crianças são chamadas pelos pais para iniciar a "cerimónia",  que consiste em bater com um pequeno pau no Caga Tió, enquanto cantam uma canção: Caga tió, caga torró, avellanes i mató, si no cagues bé, et daré un cop de bastó. caga tió! Em português, a letra da canção será algo como: Caga tronco, caga torrão, avelãs e queijo, se tu não cagares bem, bato-te com um pau. Caga tronco!

Terminada a canção, as crianças saem da sala e os pais aproveitam para deixar os presentes debaixo do cobertor. Quando tudo está preparado, os pais chamam as crianças de novo, que ficam encantadas por encontrar os presentes que o Caga Tió defecou. Originalmente, os presentes eram doces, torrão ou pequenas lembranças, hoje em dia alguns pais já dão os presentes na noite Natal e não do Dia de Reis, como é tradição em Espanha.

As cerimônias com o Caga Tió também acontecem em lugares públicos: são as chamadas cagations populars.

Uma tradição com tanto de insólito como de liberdade linguística. Quando a mim, apesar de não ser miúda, comprei um Tió, por sinal o mais sorridente de todos mas até à presente data não consegui que ele defeca-se nada.